Discos para história: Core, do Stone Temple Pilots (1992)


Na 24ª edição do Discos para história falo de Core, estreia do Stone Temple Pilots em estúdio. O trabalho foi um dos mais bem sucedidos comercialmente nos anos 1990, ocupando várias listas sobre os grandes álbuns daquela década.

História do disco

Existe a lenda que a pré-formação do Stone Temple Pilots começou da seguinte maneira: o vocalista Scott Weiland e o baixista Robert DeLeo namoravam a mesma menina, mas não sabiam disso. Um dia, no show do Black Flag, eles se conheceram por acaso e começaram a conversar, descobrindo que namoravam essa menina. Mas ao invés de levar isso ao lado pessoal, os dois ficaram amigos, romperam com a ela e formaram uma banda chamada Swing com o guitarrista Corey Hicock e o baterista David Allin completando o quarteto.

A cena em Long Beach, Califórnia, era cheia de bandas novas. Por isso, não era difícil ver Weiland e DeLeo passeando por várias apresentações ao longo da noite, e em uma delas os dois viram a performance de Eric Kretz na bateria. A boa impressão virou um convite, e o convite foi aceito positivamente. Dias depois, Hicock deixou a banda sem alegar motivo aparente. Desfalcados, Robert sugeriu Dean, seu irmão, para ocupar o cargo.


Músico sem muito sucesso, Dean DeLeo optou por mudar de lado e decidiu atuar como empresário de algumas bandas da cena local. Já estabilizado no novo trabalho, Robert e Scott tiveram que fazer grande esforço para convencê-lo a retornar à guitarra de forma profissional – o instrumento havia virado o seu principal hobby. Convencido, os irmãos DeLeo, Weiland e Kretz decidiram mudar o nome do grupo para The Mighty Joe Young no início dos anos 1990. Na mesma época, eles gravaram uma demo e, por incrível que pareça, parte do material tocado tinha algo mais funk – descartado na gravação do futuro disco.

Como já havia um bluseiro chamado The Mighty Joe Young, eles, por gostarem da marca de óleo, adotaram STP como nome da banda. Obviamente, a empresa ameaçou processá-los, por isso – eles já estavam ficando bem famosos em Los Angeles –, o nome Stone Temple Pilots acabou sendo adotado em definitivo, mas a sigla nunca foi abandonada.

No limite entre o underground e o mainstream, o STP assinou um contrato com a Atlantic para gravar o primeiro álbum. Durante cinco semanas, a banda ficou em estúdio para registrar as músicas que boa parte da Costa Oeste dos Estados Unidos já conhecia. O nome Core foi inspirado na maçã que condenou para sempre o destino de Adão e Eva na Bíblia.

Lançado exatamente no mesmo dia de Dirt, do Alice in Chains, Core dividiu os críticos. Enquanto uns acusaram a banda de imitar o grunge de Seattle, outros falavam que o trabalho era muito bom e demonstrava uma banda confiante e afiada, muito diferente de seus contemporâneos no início da carreira. Mas isso não afetou as vendas, e o disco bateu o terceiro lugar naquela semana, três posições à cima do AiC.

É difícil encaixar o STP em qualquer categoria, mesmo duas décadas após o lançamento de seu LP de estreia. A banda pode até ter sido rotulada como grunge, mas não tem nada da mistura de punk com metal. Talvez seja mais fácil encaixá-los entre o alternativo e o hard rock. Mesmo sem lugar no coração dos críticos, a banda levou o Grammy de Melhor Performance de Hard Rock em 1993, mostrando que veio para ficar no coração dos fãs.



Resenha de Core

Poucas bandas começam um disco com uma canção tão poderosa quanto “Dead & Bloated”. O baixo é incrivelmente alto, dando todo tom da música – algo mais profundo. E realmente, quem escreveu que ouviu uma banda confiante e segura do que estava fazendo em estúdio não disse nada de errado. Uma faixa cheia de metáforas e nuances sobre morte e vida. Belo começo.

Forte e alta, “Sex Type Thing” tem muito de grunge, e talvez por isso a banda acabou sendo jogada na subcategoria. Diferentemente do pensado, a letra é sobre abuso sexual e como as pessoas podem ser ruins com outras com uma ironia incrível – claro que muita gente não entendeu, mas faz parte. Tem cara e foi o primeiro grande hit a banda na MTV.



Sem nunca ter sido lançada como single, “Wicked Garden” ganhou ares de clássico pela performance de Scott Weiland no palco, dando tudo de si e mais um pouco para proporcionar uma experiência única. Até aqui, não temos falhas e só tem canções fortes com temas de pura reflexão – de um protesto contra o abuso sexual até a perda da inocência, como é o caso da terceira faixa, que conta com uma bateria muito do hard rock.

Instrumental, “No Memory” faz a ponte para a sombria “Sin”, canção que casa bem com o nome do disco. Bem compassada, ela tem um ar etéreo, lembrando um pouco do heavy metal proposto pelo Black Sabbath nos primeiros discos, mas coloca os instrumentos de corda como pontos altos da parte final. “Naked Sunday” lembra um pouco as letras cantadas a plenos pulmões pelo Rage Against the Machine – injustiça social é a temática em que o pecado é apenas pelo efeito na voz de Weiland.



Um dos singles do álbum, a tranquila “Creep” fala de um momento real vivido por Scott e Dean DeLeo em que eles ficaram muito mal. Inspirada em “Heart of Gold”, de Neil Young, a canção, com a segunda voz muito clara na mensagem que está passando, nasceu para ser assim: triste e convidativa a reflexão. Já “Piece Of Pie” traz muito da característica do STP ao longo dos anos: a guitarra pesada, o baixo ganhando destaque e a bateria sendo atacada sem dó.

Logo depois vem o grande clássico da banda: “Plush”. Ela foi escolhida para ser o segundo single de Core e conseguiu colocar de vez a banda no topo das paradas americanas, sendo eleita uma das principais músicas de 1992. A faixa mostra o desperdício de talento caso Dean DeLeo tivesse optado pela carreira de empresário. Quem também estava muito bem à época era Weiland, transmitindo todo sentimento possível à faixa, que mistura uma nota de um assassinato em um jornal com os problemas de relacionamento que as pessoas enfrentam na vida.



Em “Wet My Bed” temos algo que lembra o Velvet Underground: uma letra mais falada do que cantada e cheia nuances do alternativo. Escolhida muitas vezes para abrir os shows, “Crackerman” é arrepiante por vários motivos, sendo o principal deles a história de um cara que é traficante de heroína. A voz, distorcida em parte do refrão, consegue passar a sensação de que estamos entrando na vida do personagem. Outros destaques são a velocidade e o peso da canção, que também virou clássico sem ter sido lançada como single.

Com mais de oito minutos,”Where The River Goes” encerra Core com um épico doloroso e cheio de metáforas sobre relacionamentos. De cara, é impossível não lembrar de Led Zeppelin não só pela duração, mas pela melodia e pelo uso de cada instrumento – com o solo de guitarra ganhando imenso destaque.

O STP foi muito bem ao conseguir agregar referências em seu trabalho de estreia. Misturando um pouco de heavy metal, hard rock e punk, a banda fez um álbum muito coeso e com ritmo muito bom, alternando bem entre músicas mais pesadas e leves. Por isso, mesmo com essa presepada de chamar Chester Bennington para ser o novo vocalista após a saída de Scott Weilland no início deste ano, Core merece ser ouvido por qualquer pessoa que deseja ter uma banda. É essencial para aprender que é possível não se prender a apenas um estilo.



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